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sábado, 25 de janeiro de 2014

OS PARADOXOS DA RESSURREIÇÃO




Gosto da forma crítica como Philip Yancey (Editora Vida) aborda as questões religiosas. Ele não esconde as suas angústias, não finge estar tudo bem quando o interior  está em conflitos.  Ele expõe o problema com clareza. Ele se vê como parte do problema.
Ele diz, em um dos seus livros (O Jesus que eu nunca conheci), que gostaria que Jesus não tivesse ressuscitado. Razão? Muitas.
Primeiramente porque ele não precisaria ser um seguidor de Jesus. Poderia ser um admirador, um leitor das obras de Jesus, mas não necessariamente um seguidor. Seguir a Jesus é muito difícil. Amar os inimigos, fazer bem aos que nos perseguem, ser pacificador, lavar os pés de quem vai nos trair, tolerar a ignorância dos discípulos (amigos), são coisas que todo mundo discursa a favor e ninguém pratica. E ser misericordioso então? Alguém sabe o que é isso? Aliás, alguém sabe o que é respeitar o outro? Alguém sabe o que é tratar o outro como ser humano?
Em segundo lugar porque se Jesus não tivesse ressuscitado ele não mais O encontraria, logo, não teria que prestar contas. Já pensou viver uma vida de hipocrisia, carregar a alma com preconceitos, usar o púlpito para estimular a mediocridade em nome de Jesus, discriminar em nome de uma suposta verdade divina e depois encontrar-se com Jesus e ouvi-Lo dizer: “você fez tudo diferente, meu filho”? Imagine Ele lhe falando: “Foi outra coisa que Eu propus”. Se Ele estivesse morto não correríamos este risco.
E aqueles que gostam de julgar, como vão encontrar a Jesus? Sem a ressurreição eles não teriam esse problema. As pessoas esquecem que o julgamento é prerrogativa de uma instituição e deve incidir sobre o ato e não sobre a pessoa.
Não sei se o leitor observou as contradições que se ensinam em nome de Jesus e todos dizem estar certos. Se Ele não tivesse ressuscitado ficaríamos  livres de possíveis vexames como esses.
Mas Ele ressuscitou e isso trouxe preocupações. Podemos encontra-Lo a qualquer momento e ter que prestar contas, e não há como fugir. Se Ele ressuscitou isso nos diz que não adianta prendê-Lo mais. Se nem os guardas romanos conseguiram detê-Lo na sepultura, quem conseguirá controla-Lo? Se Ele renasceu da cruz, também renascerá do fogo, da forca, do fuzilamento e da câmara de gás. Ele é incontrolável. Não adianta alguém se trancar dentro de casa para não vê-Lo. Ele entra sem abrir a porta. Não podemos nem duvidar da Sua existência porque Ele pode nos mostrar as Suas mãos e os Seus pés feridos e ainda nos dizer: “bem aventurados os que não viram e creram” (Jo 20:27,29).
Com a ressurreição Ele pode ficar onde quiser, ir para onde quiser e quando quiser. Isso significa que não adianta fazermos uma agenda para ele dizendo quando deve voltar, a quem deve abençoar,  a quem deve curar. Não temos como agarra-Lo e dizer: “faça assim” ou “fique aqui”. Se Ele quiser poderá ficar de fora de todos os nossos planos e projetos. Não podemos nem mesmo ameaça-Lo porque Ele possivelmente não sentirá nem mesmo a angústia do Getsêmani novamente.
Particularmente, a Sua ressurreição me incomoda porque mostra a minha pequenez, reduz-me à insignificância em termos de controle e domínio sobre Ele.
Jesus ressuscitado trouxe-me um conflito porque se afigura contraditório para mim. Ele me angustia porque quer que eu  viva o que Ele pregou (o respeito, a tolerância, a bondade) e pode me cobrar isso. Ele me anima porque traz esperança de vida eterna. Tenho esperança nas cicatrizes de Jesus. Ele diz que Deus não vai deixar a morte vencer. Não é contraditório? Apontar um caminho difícil e dizer que vai dar certo no final não lhe incomoda? Se o que pregam nos púlpitos sobre o juízo final for verdadeiro não seria melhor morrer sem pensar na ressurreição?
É perigoso seguir alguém tão contraditório. Posso me perder. Perder-me no sentido de não conseguir entender essa contradição e usá-la contra mim e contra os outros. Imagine eu tendo medo de Jesus e ao mesmo tempo tendo esperança? Uma hora enfatizo o juízo implacável de Jesus e na hora seguinte a Sua  bondade e tolerância. Não gera confusão? Não é isso que se faz nos púlpitos?
Afinal, a Sua ressurreição para que serviu? Para dar vida ou para trazer medo?
Paulo (Rm 8) disse que não há condenação para os que estão em Cristo Jesus, mas a mensagem do juízo sem misericórdia brota espontaneamente dos púlpitos. Onde está o problema? Sua ressurreição trouxe ânimos aos discípulos. Fê-los ousados, intrépidos. Os púlpitos hoje estão cheios de recomendações inibidoras, mensagens carregadas de pessimismo no que diz respeito a ousar, discordar, opinar, etc. Será que o que era para a vida se tornou em morte?
Jesus ressuscitou depois de uma morte cruel e duas noites na sepultura. Será que Ele não nos  ajuda a “ressuscitar” depois de uma frustração? Por que ficar evitando erros se Ele não evitou o caminho da cruz?
Bem, mas Ele morreu para o nosso bem, dirá o leitor. E nós sempre erramos por maldade? Será que também não erramos tentando acertar? Se nos recuperamos do choque, depois de ter errado tentado acertar, nos tornamos também paradoxal ou uma contradição? Ele ousou enfrentar a cruz e foi corajoso, enquanto, pela pregações,  nós, se nos atrevemos a ousar, somos imprudentes?
Tantas questões! Viver não é simples e ser cristão muito menos. Fico admirado em ver pessoas que pensam ter encontrado a fórmula mágica do viver. Têm receitas prontas, dizem saber todos os passos. Será que são seres pensantes?
Nova Andradina, 09 de fevereiro de 2012
Antonio Sales      profesales@hotmail.com

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

AINDA MATAMOS OS PROFETAS?



Jesus certo dia pressionado pelos escribas e fariseus disse-lhes que eles eram culpados pela morte dos profetas que tanto veneravam. Eram filhos daqueles que mataram os profetas (Mt 23:29-31).
Na história do povo israelita os profetas não eram bem vindos embora as gerações futuras redessem homenagem a esses corajosos que se levantaram para defender a justiça. Jesus disse que alguns foram mortos no altar, inclusive. Altar era o lugar de proteção da vida. Quando alguém se sentisse ameaçado fugia para o templo e se colocava ao lado do altar, agarrado a ele, e era protegido pelos sacerdotes. A lei levítica previa isso.
Alguns profetas foram mortos no altar. Por quê? Quem eram os profetas?
Profetas eram vozes discordantes, vozes que soavam alertando do engano em que as pessoas se encontravam, vozes que denunciavam a hipocrisia da liderança,  eram pessoas que condenavam a duplicidade no viver, que denunciavam as injustiças sociais e a exploração da ignorância do povo. Os profetas que falavam em nome de Deus condenavam os líderes da nação porque mantinham o povo sob pressão psicológica, opressão econômica e opressão política.
Profetas eram vozes que condenavam o isolamento em relação aos problemas sociais, que se posicionavam contra aqueles que viviam como se os problemas sociais não lhes diziam respeito.
Denunciavam aqueles que viam o “mundo lá fora” como sinônimo de corrupção e os de dentro como seres purificados, imunes a esses malefícios. Eram contra os que separam as pessoas em duas categorias estáticas: os mundanos e os da igreja.
Essa classificação colocava os judeus (e nos coloca hoje) na posição de julgadores do mundo, classificadores de pessoas e nos impede de ver os próprios erros, de tirar a trave do próprio olho.
Eram (e ainda são)  denunciados pelos profetas: os maldizentes, os produtores de intriga, os adúlteros (qualquer espécie de adultério), todos que se julgam superiores pelo fato de estarem dentro do “redil” mesmo que devorando ovelhas e que tenham a pele da cor da pele do lobo. São denunciados o que têm a pele manchada pelo “sangue” de ingênuos que se deixam seduzir pelos seus discursos e se tornam vítimas de suas ideias estapafúrdias.
Os judeus mataram aqueles que denunciavam os que confiavam no templo, numa prática mecânica da religião, e ignoravam as necessidades humanas (Jr 7:4-6).  Rejeitaram aqueles que lhes dizia que a sua religião os estava conduzindo ao abismo, ao obscurantismo, à intolerância. Rejeitaram aqueles que procuravam lhes mostrar que estavam sendo enganados pelos seus líderes, seduzidos por discursos fabricados com intenções de amedrontá-los. Mataram os que lhes diziam que estavam sem crescimento moral e espiritual porque eram mal conduzidos.
Hoje não somos diferentes. Ainda matamos profetas. Se não lhes derramamos o sangue, porque as leis não permitem, provocamos lágrimas copiosas. Causamos-lhes desespero ao verem a nossa estupidez e nossa falta de vontade de abrir os olhos. Matar nem sempre significa tirar a vida; pode significar também amordaçar, desprezar, fazer pouco das suas palavras.
Todos aqueles que procuram abrir os nossos olhos, apontar para o verde que está fora do redil do falso pastor, são excomungados por nós. Preferimos quem nos engane, que nos faça crer que estamos no caminho certo. Preferimos os que nos humilham aos que nos alertam.
Campo Grande, 01 de maio de 2013.
Antonio Sales     profesales@hotmail.com