O apóstolo Paulo (Rm 7:10,11) escreveu que “ o mandamento, que era
para vida, achei eu que me era para morte”. Ele confundiu. Aquilo que era para trazer vida lhe
trouxe morte, aquilo que ele julgava ser vida, era morte. “Porque o pecado, tomando
ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou”, isto é, a sua condição, as suas perspectivas
estavam em desarmonia com o plano maior, que era o plano de Deus. Ele pensava
estar fazendo o correto e descobriu-se no caminho errado. Sorte dele!
Digo que foi sorte dele porque descobriu o equívoco em tempo de reorientar
a trajetória, de mudar o rumo. Mandamento neste texto, segundo o meu entender,
é uma referência às orientações divinas, de forma geral, e não está resumido
aos dez preceitos do Decálogo. Todas as normas do bem viver, normas de relacionamentos
humanos e relacionamento entre o homem e Deus, Paulo chama de mandamento.
Ele pensava que estava agindo corretamente e descobriu, em tempo, que
teria que alterar o percurso.
Mas, por que há vida e morte na religião?
Li recentemente o livro “Eu sou Malala” da menina que foi baleada pelo Talibã.
No seu relato ela conta sobre o agir dos talibãs. São pessoas honestas, que
creem no Corão, que falam em nome de Deus, que pensam que a religião deve ser
purificada, que Deus está sendo desonrado pelo modo geral de agir das pessoas.
É preciso fazer uma limpeza espiritual no povo, para que a religião seja
também limpa, pensam eles. Os males do mundo (secas, tufões, violência, tsunamis)
são consequências da desaprovação divina pela falta de compromisso espiritual e
moral da humanidade.
Esquecem que Jesus disse que o sol e a chuva vêm igualmente sobre justos
e injustos (Mt. 5:45), isto é, que Deus não está julgando o mundo pelo comportamento
das pessoas. Ele não está punindo a todos pelo comportamento de alguns.
Essas pessoas, fundamentalistas, agem em nome de Deus sem a Sua autorização
e produzem morte. Matam literalmente, diz Malala. Incendeiam escolas que educam
meninas e queimam, com ácido, o rosto de meninas que saem de casa sem o véu.
A religião que era para trazer vida, esperança e alegria, se transforma em medo,
culpa e morte. Quando fundamentalistas se propõem apurificar a religião, a morte
substitui a vida.
Quando o legalismo toma o lugar da graça, a oportunidade cede lugar à
culpa. Quando as posturas mais radicais se manifestam a graça evade e o medo, o
pecado e a intriga se fazem presentes.
Quando a fuga da realidade presente se manifesta através de expectativas
futuras, incertas pela ausência de datas, a apatia se torna visível.
É a morte através da religião.
É dessa forma que aquilo que devia ser vida transformou-se em morte.
Antonio Sales
Campo Grande, 08 de fevereiro de 2014