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domingo, 16 de outubro de 2011

A MÚSICA NO CULTO


A música não é o único fator do culto. Muitos outros fatores contribuem para a sua beleza e riqueza ou para sua pobreza e feiura.
No entanto, quase não se vê ninguém debatendo a contribuição do sermão, da oração pública, da simpatia dos irmãos, da cortesia e da atenção para um bom culto. No meio onde vivo o debate gira em torno da música. Aliás,  não é nem um debate porque quase sempre é um discurso unilateral. É um falando e os outros ouvindo calados. Muitos ouvem calados porque não concordam com a forma como o “debate” é conduzido mas sabem que se falarem em nada contribuirão porque o discurso está pronto e o “debate” é só de nome.
O curioso é que querem nos convencer de que a música é o mais importante fator do culto. Qual a razão? A explicação é simples, simplista e absurda. Primeiro dizem que é porque é a arte preferida de Satanás. Depois dizem que ele foi regente do coro celestial e, portanto, um perito em música. O que tem isso a ver  com o que estou dizendo?
Ora, se ele é tão competente quanto se diz então ele deve saber capinar, cuidar de animais, Matemática, Física, Medicina e outras tantas coisas mais. Deve falar a verdade de vez em quando, ser bom esportista e dominar a música clássica também. E daí? Não vou fazer  nada porque, supostamente, é de conhecimento dele?
Essas explicações deixam-me atordoado. Se é a arte preferida de Satanás deveria fazer parte da adoração? O fato de ele ser perito em música tem algo a ver com aquilo que faço ou canto? Estão supondo que ele é a minha inspiração? Se é ele que também inspira a inveja, a intriga, o fuxico e a desordem, então tudo o que se faz em algumas igrejas é inspiração dele?  O que mais se faz em algumas igrejas é cantar e intrigar.
Ninguém se preocupa com a pobreza dos sermões, com a discrepância de uns e o óbvio inútil de outros.
Quando se vai ao médico com uma fratura exposta, gritando de dor, e o profissional diz que está com dor porque está com uma fratura exposta ele falou o óbvio inútil. Primeiro porque o paciente já sabe o diagnóstico e em segundo lugar porque ele espera uma proposta de solução, uma palavra de esperança.
Quando um pregador afirma que a violência que há no mundo e a falta de Cristo no coração das pessoas ele falou o óbvio inútil. Quando ele diz que a sua igreja está apática porque falta o amor, falou o óbvio inútil. Quando afirma que se deve deixar o pecado, fala o óbvio inútil. Quando diz para tirar  a inveja da bagagem fala o óbvio inútil. Quando afirma que o mundo invadiu a igreja falou o óbvio inútil. São coisas que todos sabem, só não estão conseguindo fazer. Todo mundo sabe disso, pois se estamos no mundo, convivemos no mundo, aprendemos no mundo, usufruímos das benesses do mundo, como podemos deixar o mundo na hora de ir para a igreja? Será que eles imaginam que o mundo é como um casaco que pode ser deixado em casa no verão?   
O mundo é como uma roupa de uso contínuo, com a qual se está vestido: se estou nela então ela tem que estar em mim. Não se deixa o mundo assim quando se quer tão pouco se tira a inveja da bagagem com um passe de mágica.
Por que não nos ensinam como administrar o conflito entre os interesses do mundo e os interesses da igreja?
Ninguém reclama disso? Ninguém vai exigir melhora nos sermões?
Lembro-me de uma ilustração que li algures. Dizia que um jovem teologando de uma igreja congregacional se despontava como excelente orador e por isso no dia da formatura foi convidado para pastorear uma igreja grande e abastada. Foi contratado com um invejável salário.
Antes de chegar ele anunciou que iria desbancar diversos deuses cultuados na igreja. Ficaram na expectativa. No primeiro domingo ele pregou sobre o “deus tabaco”. Falou sobre os seus malefícios e sobre a incoerência de um cristão cultivar ou vender o produto e anunciou que no próximo domingo atacaria o “ deus álcool”. À saída ficou na porta para cumprimentar os membros que foram saindo em silêncio. Por último um diácono o procurou e disse-lhe: o pastor sabia que nesta igreja vários dos membros mais ricos cultivam e vendem tabaco?
Ele não se intimidou e no próximo domingo, com o mesmo entusiasmo e agressividade desbancou o “deus bebidas alcoólicas”. À saída o mesmo ritual e a mesma advertência do diácono: muitos dos que pagavam o alto salário do pastor eram donos de destilarias e vendiam no varejo e no atacado a maldita bebida. Mas ele não se intimidou e disse que manteria o título do sermão do próximo domingo: “o deus pesca predatória”.
Na próxima sexta-feira, à tardinha, o diácono o procurou e avisou-lhe que a comissão da igreja, composta em sua maioria por ofendidos em seus dois últimos sermões e que seriam ofendidos pelo próximo sermão, estaria se reunindo naquela noite para decidir se ele seria ainda pastor daquela igreja. Estava em jogo, inclusive, se ele pregaria ou não o sermão de domingo. O jovem se deu conta que precisava fazer alguma coisa para se manter no cargo e perguntou ao diácono onde eles pescavam e foi informado de que era nos rios da região. Teve uma idéia: pediu que se ele não pudesse evitar a sua demissão que, pelo menos, insistisse para que o deixassem pregar naquele domingo.
O diácono teve êxito e naquele domingo ele foi fazer o que seria seu “último” sermão. Pregou com entusiasmo e com palavras agressivas contra a “pesca predatória em alto mar”, em águas intercontinentais. Conseguiu salvar o seu ministério.
É isso que ouço hoje. Ou falam sobre o óbvio inútil ou sobre “pesca predatória em águas intercontinentais”. Nada serve para nada ou muito pouco se aproveita.
As famílias em desespero ficam sem uma palavra de ânimo, os jovens ficam sem orientação, os pais ficam sem saber como educar os filhos na perspectiva daquela comunidade, os pecadores ficam sem saber como superar a crise existencial decorrente, os traídos ficam sem saber como lidar com o perdão, os desanimados saem sem ouvir uma palavra de conforto,  os desprezados saem sem receber um sorriso acolhedor, os desempregado saem sem receber orientação sobre como proceder numa entrevista, os deprimidos saem sem ouvir que a ciência moderna tem alívio para a sua dor,  o invejoso sai sem saber porque é dominado pela inveja, o arrogante sai sem saber o mal que causa e assim por diante.
Não daria para ensinar sobre tolerância e respeito? Não daria para ocupar o tempo ensinando com superar o legalismo e se apropriar da graça?  Não daria para contextualizar o texto bíblico falando sobre a condição social do povo, suas crenças, na época em que foi escrito? Não daria para recontextualizar  o texto dizendo o que serve e que não serve para hoje?
Não seria possível observar as necessidades da membresia e tratar desses assuntos sem afetar as pessoas,  isto é, atacar o problema sem identificar a pessoa?
Não está na hora de mudar? Por que se preocupar tanto com a música se é ela que ainda dá um tom de graça ao culto?  Não será por isso que nas igrejas se canta mais do que se prega?  Cantar instrui pouco, mas alivia o fardo. Os sermões não instruem nada e ainda sobrecarregam a vida com inutilidades  e sentimento de culpa .
Quero concluir dizendo: parabéns aos músicos  que inovam e criam. Pêsames aos pregadores que copiam e aos “debatedores” unilaterais.
Campo Grande, 14 de outubro de 2011
Antonio Sales                              profesales@hotmail.com

12 comentários:

  1. Sabe, este último Sábado dia 15, depois de muita insistência, levei minha mãe á igreja para visitar e conhecer a igreja. Na hora do culto estava tudo indo bem, a música estava ótima, mas aconteceu algo inesperado: assim que o pregador começou a falar ele repetiu umas dez vezes a palavra "todas" no seu sermão, minha mãe já não gostou, ainda como se não bastasse tinha algumas mulheres sentadas no banco atrás do nosso que não paravam de conversar, e a gente não sabia se escutava o pregador ou a conversa delas. Foi então que minha mãe virou para trás e mandou (literalmente) elas ficarem quietas porque ela queria ouvir o tal sermão.
    E isso me fez refletir que nós como membros realmente não demos a devida importancia á coisas simples como a recepção e a hospitalidade dos visitantes. Ficamos batendo sempre na mesma tecla que esquecemos que a igreja não é formada apenas por mensagens musicais, mas sim parte de um todo.

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  2. Parabéns Sales pelo brilhante e útil texto!

    Precisamos pensar mais sobre tudo aquilo que está relacionado ao universo cristão, de dentro e de fora da igreja - pois a realidade (e sobretudo a missão) cristã não se restringe às paredes do templo.

    A música, mesmo sendo de grande importância, é apenas um dos aspectos que permeiam a vida do cristão e da liturgia do culto. Ainda assim, as questões levantadas por ti são necessárias, pois não vem de alguém que não tem experiência com a música (como se vê muito por aí nas igrejas e na internet), mas de um professor doutor em Matemática, exímio escritor, grande músico, e dedicado clarinetista.

    Tocar um instrumento e ler partitura são o óbvio e o esperado de qualquer musicista. Fazer isto e refletir sobre as questões éticas e estéticas da música num contexto terreal e espiritual são características de um verdadeiro grande músico!

    Pena que a maioria das pessoas que pregam, escrevem e discursam sobre música na igreja são leigos no assunto, quando não, analfabetos musicais. É uma triste, mas fatídica realidade.

    Alguns pensam que porque alguns textos APARENTAM dizer algumas coisas, que isto deve ser encarado como norma divina, mesmo que tais leitores não tenham nenhum conhecimento teórico e prático na área.

    NÃO CONTESTO A FONTE, MAS A INTERPRETAÇÃO, mesmo sendo ela uma tradição ou costume, afinal, dogmas não podem ser aceitos pelos cristãos como verdade.

    E não estou falando simplesmente de cantar ou tocar algumas músicas. O conhecimento e experiência na música - como em toda área do conhecimento - requer muito mais do que um simples e superficial contato com o assunto, para se ter uma compreensão ampla do tema.

    Ainda assim, a esmagadora maioria dos que se entitulam defensores da "boa música" nas igrejas não tem codições de tratar do assunto, pois não compreendem do que estão querendo condenar e/ou denfender.

    Para entender sobre música sacra é fundamental conhecer a Palavra de Deus e tudo aquilo que aceitamos como orientação divina. Isto é crucial, e não contesto isto. O que não podemos esquecer é que além disto, existem muitas outras coisas a se conhecer, como por exemplo, a história da igreja, a história da música, a história da música nas igrejas, a história dos instrumentos musicais, teoria musical, conhecer as diversas culturas e gêneros musicais, cantar, tocar, ser um músico pensante, crítico e ativo, e etc...

    Não fazer nada disto (ou muito pouco) e usar um discurso condenatório sobre aqueles que estudam, tocam e cantam por anos e anos, é muito simples, mas perigoso, para a igreja e para as pessoas.

    Muita gente abandonou a arte dos sons e até mesmo os caminhos do Senhor por palavras ríspidas de "ungidos e consagrados" arautos da verdade. Para estes faria bem conhecer o que diz o apóstolo Paulo:

    "Não vos torneis causa de tropeço nem para judeus, nem para gentios, nem tampouco para a igreja de Deus" - I Cor. 10:32

    O verdadeiro músico pode até ter um posicionamento conservador sobre a música na igreja (e ele, como todo ser humano, tem direito para tal), mas nunca agirá de maneira condenatória, inquisitiva, excludente, segregacionista, como se apenas ele tivesse recebido iluminação divina e soubesse qual a música aceitável pelo Eterno, e que todos os demais se encontram em trevas. Ele agirá com respeito, bom senso, ética, maturidade, e acima de tudo, cristianismo.

    Sim, está na hora de mudar. E não só a música e os demais itens que foram abordados aqui. Se pensarmos bem, há muito o que fazer. E este texto com suas perguntas será uma mola propulsora que nos auxiliará a pensar e a encontrar meios de contribuir positivamente com a igreja e com o mundo.


    Alfredo Ericeira

    Graduado em Música pela UFMS, Ministro de Música na IASD, regente coral, pianista, compositor, arranjador, professor de música, crítico musical, e representante do MS no concurso sul-americano Bom de Bíblia em 2008.

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  3. Olá amigos leitores
    Depois de ler estes dois comentários, resta-me agradecer a contribuição do amigo anônimo e me calar diante da exposição do Alfredo.
    Um viveu na carne o que eu disse sobre a falta de objetividade no sermão, que poderia atrair a atenção dos ouvintes, e o outro é autoridade no que diz.

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  4. Penso que a vida espiritual, como a vida material, também precisa de nutrientes espirituais. De forma análoga: se não podemos viver só de gordura, não podemos viver, espiritualmente, só de música. O macro-nutriente do culto deve ser um sermão instrutivo e a maioria deles deve ser messiânico, cristocêntrico. Oras, o ponto central das Escrituras é o Messias e a nossa redenção por meio dEle...
    Um dos segredos de fé de Yov [Jó]: "Não me afastei dos mandamentos dos seus lábios; dei mais valor às palavras de sua boca, do que ao meu pão de cada dia." Jó 23:13 (NVI)

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    1. é verdade, porém, para quem ver o louvor apenas como um musica, pensa realmente dessa forma.
      Porém Esta foi a maneira didática de Deus ensinar ao seu povo, a importância de ser agradecido diante dEle. Hoje, não temos a necessidade de oferecer sacrifícios, pois Cristo na cruz foi o último sacrifício aceito por Deus, em substituição pelos nossos pecados. Entretanto, as orientações para que sejamos agradecidos continuam por toda a Bíblia e são válidas para nós hoje (I Cr29:10-14;SI 100:4; I Co I5:57;2Co2:I4; Fp 4:6; I Ts5:l8).
      O louvor que vem do coração para Deus e nao da boca para o teto

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    2. O assunto música rende muitos debates. Penso que a música é realmente importante. Não mais do que sermão e outros componentes do culto.

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  5. Muito bem colocado, amigo anônimo.

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  6. uau, só tem gente notória aqui neste blog... Professor Sales, estou "gamadão" no seu blog, nos seus posicionamentos, vejo muitas afinidades entre nosso pensar... bom saber que há mais pessoas que pensam como eu! às vezes me sinto isolado e solitário na minha cidade, e nas Igrejas então, Deus me guarde...

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  7. Olá amigo. Obrigado pela sua posição.
    Vamos continuar a luta.

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  8. Amados, a um certo esquecimento de que um culto nao trata-se de uma liturgia simples, mais sim um momento de adoroção a Deus.
    Um nao podemos tger apenas musicas e sim louvores, hinos de adoração a Deus.
    A letra mata mais o espirito vivifica

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