Gosto da forma crítica
como Philip Yancey (Editora Vida) aborda as questões religiosas. Ele não
esconde as suas angústias, não finge estar tudo bem quando o interior está em conflitos. Ele expõe o problema com clareza. Ele se vê
como parte do problema.
Ele diz, em um dos seus
livros (O Jesus que eu nunca conheci), que gostaria que Jesus não tivesse
ressuscitado. Razão? Muitas.
Primeiramente porque ele
não precisaria ser um seguidor de Jesus. Poderia ser um admirador, um leitor
das obras de Jesus, mas não necessariamente um seguidor. Seguir a Jesus é muito
difícil. Amar os inimigos, fazer bem aos que nos perseguem, ser pacificador, lavar
os pés de quem vai nos trair, tolerar a ignorância dos discípulos (amigos), são
coisas que todo mundo discursa a favor e ninguém pratica. E ser misericordioso
então? Alguém sabe o que é isso? Aliás, alguém sabe o que é respeitar o outro? Alguém
sabe o que é tratar o outro como ser humano?
Em segundo lugar porque
se Jesus não tivesse ressuscitado ele não mais O encontraria, logo, não teria
que prestar contas. Já pensou viver uma vida de hipocrisia, carregar a alma com
preconceitos, usar o púlpito para estimular a mediocridade em nome de Jesus, discriminar
em nome de uma suposta verdade divina e depois encontrar-se com Jesus e ouvi-Lo
dizer: “você fez tudo diferente, meu filho”? Imagine Ele lhe falando: “Foi
outra coisa que Eu propus”. Se Ele estivesse morto não correríamos este risco.
E aqueles que gostam de
julgar, como vão encontrar a Jesus? Sem a ressurreição eles não teriam esse
problema. As pessoas esquecem que o julgamento é prerrogativa de uma
instituição e deve incidir sobre o ato e não sobre a pessoa.
Não sei se o leitor
observou as contradições que se ensinam em nome de Jesus e todos dizem estar
certos. Se Ele não tivesse ressuscitado ficaríamos livres de possíveis vexames como esses.
Mas Ele ressuscitou e isso
trouxe preocupações. Podemos encontra-Lo a qualquer momento e ter que prestar
contas, e não há como fugir. Se Ele ressuscitou isso nos diz que não adianta
prendê-Lo mais. Se nem os guardas romanos conseguiram detê-Lo na sepultura,
quem conseguirá controla-Lo? Se Ele renasceu da cruz, também renascerá do fogo,
da forca, do fuzilamento e da câmara de gás. Ele é incontrolável. Não adianta alguém
se trancar dentro de casa para não vê-Lo. Ele entra sem abrir a porta. Não podemos
nem duvidar da Sua existência porque Ele pode nos mostrar as Suas mãos e os Seus
pés feridos e ainda nos dizer: “bem aventurados os que não viram e creram” (Jo
20:27,29).
Com a ressurreição Ele
pode ficar onde quiser, ir para onde quiser e quando quiser. Isso significa que
não adianta fazermos uma agenda para ele dizendo quando deve voltar, a quem
deve abençoar, a quem deve curar. Não
temos como agarra-Lo e dizer: “faça assim” ou “fique aqui”. Se Ele quiser
poderá ficar de fora de todos os nossos planos e projetos. Não podemos nem
mesmo ameaça-Lo porque Ele possivelmente não sentirá nem mesmo a angústia do
Getsêmani novamente.
Particularmente, a Sua
ressurreição me incomoda porque mostra a minha pequenez, reduz-me à insignificância
em termos de controle e domínio sobre Ele.
Jesus ressuscitado trouxe-me
um conflito porque se afigura contraditório para mim. Ele me angustia porque quer
que eu viva o que Ele pregou (o
respeito, a tolerância, a bondade) e pode me cobrar isso. Ele me anima porque
traz esperança de vida eterna. Tenho esperança nas cicatrizes de Jesus. Ele diz
que Deus não vai deixar a morte vencer. Não é contraditório? Apontar um caminho
difícil e dizer que vai dar certo no final não lhe incomoda? Se o que pregam
nos púlpitos sobre o juízo final for verdadeiro não seria melhor morrer sem
pensar na ressurreição?
É perigoso seguir
alguém tão contraditório. Posso me perder. Perder-me no sentido de não
conseguir entender essa contradição e usá-la contra mim e contra os outros.
Imagine eu tendo medo de Jesus e ao mesmo tempo tendo esperança? Uma hora
enfatizo o juízo implacável de Jesus e na hora seguinte a Sua bondade e tolerância. Não gera confusão? Não é
isso que se faz nos púlpitos?
Afinal, a Sua
ressurreição para que serviu? Para dar vida ou para trazer medo?
Paulo (Rm 8) disse que
não há condenação para os que estão em Cristo Jesus, mas a mensagem do juízo
sem misericórdia brota espontaneamente dos púlpitos. Onde está o problema? Sua
ressurreição trouxe ânimos aos discípulos. Fê-los ousados, intrépidos. Os
púlpitos hoje estão cheios de recomendações inibidoras, mensagens carregadas de
pessimismo no que diz respeito a ousar, discordar, opinar, etc. Será que o que
era para a vida se tornou em morte?
Jesus ressuscitou
depois de uma morte cruel e duas noites na sepultura. Será que Ele não nos ajuda a “ressuscitar” depois de uma frustração?
Por que ficar evitando erros se Ele não evitou o caminho da cruz?
Bem, mas Ele morreu para
o nosso bem, dirá o leitor. E nós sempre erramos por maldade? Será que também
não erramos tentando acertar? Se nos recuperamos do choque, depois de ter errado
tentado acertar, nos tornamos também paradoxal ou uma contradição? Ele ousou
enfrentar a cruz e foi corajoso, enquanto, pela pregações, nós, se nos atrevemos a ousar, somos
imprudentes?
Tantas questões! Viver
não é simples e ser cristão muito menos. Fico admirado em ver pessoas que
pensam ter encontrado a fórmula mágica do viver. Têm receitas prontas, dizem
saber todos os passos. Será que são seres pensantes?
Nova Andradina, 09 de
fevereiro de 2012
Antonio Sales profesales@hotmail.com