Sobre a fé desse patriarca dois
apóstolos divergem. Tiago afirma que a fé do patriarca se consumou pelas obras,
por ter oferecido o seu filho ( Tg 2:21). Paulo afirma que a sua fé se revelou
sem obras (Rm 4:2,3). Não vejo como conciliar as duas posições. Elas são
opostas e Paulo é enfático ao dizer que não foi pelas obras (Rm 4:4). Não foi a
obediência á lei, mas a aceitação da graça que o transformou em exemplo a ser
imitado (Rm 4:16).
Ao ler essas duas posições opostas fica
a questão: com quem se identificar? Com Paulo ou com Tiago?
Pensemos um pouco sobre a história de
Abraão.
O mundo em quem viveu, em termos sociais,
não se parece com o nosso. A poligamia masculina era liberada e Abraão teve
concubinas (Gn 25:6). As mulheres não tinham direito de escolha e Abraão usou
Hagar (Gn 16:1-4) sem lhe perguntar se era seu desejo ter um filho com ele. Com
isso quero dizer que ele seguia as regras do seu tempo.
No seu tempo era comum o sacrifício
humano aos deuses. Muitos pais abastados
sacrificavam o filho mais velho ao seu deus para receber mais bênçãos, para
receber mais filhos. Quando Deus foi instituir o sistema de culto israelita
Ele determinou que o todo animal macho
primogênito de certas espécies (as consideradas limpas) deveria ser oferecidos no altar de holocausto. Uma forma de desviar
ou substituir o culto de humanos. Os homens deveriam ser mantidos vivos (resgatados)e
serem substituídos por animais ( Ex 13:2,13-15; Lv 27:26).
Romper com uma crença requer tempo, um
trabalho didático bem elaborado, e o Deus dos hebreus fez isso. Seu plano era
que com o tempo também os animais deixassem de ser sacrificados. Ele pensava em
uma progressão nos costumes e nas crenças. Ao morrer na cruz Cristo deixou
claro que não era o sacrifício de animais o objetivo de Deus (Mt 27:51). Ficou
evidente que o sistema judaico foi instituído para substituir o sacrifício de
humanos e que depois deveria ser também substituído ou eliminado.
Voltemos a Abraão. No seu tempo era
assim. O sacrifício de humanos estava na ordem do dia (Lv 18:21, 2Re 23:10).
Isaque possivelmente já teria sido avisado pelos servos do pai e pelos
coleguinhas de que ele era a vítima. Estava esperando que isso acontecesse com
ele. Ao ir para o monte com o pai ele suspeitava e esperava que o pai lhe falasse abertamente
sobre isso. Tanto é assim que provocou o pai com a pergunta: onde está o
cordeiro?(Gn 22;7,8)
Abraão não ia sacrificar Isaque a pedido
do Deus de Israel, mas para cumprir um
ritual da época. Seu coração estava pesaroso porque era o filho da promessa,
mas, ao mesmo tempo, era grato a Deus pelo milagre do seu nascimento. Era de
Deus e a Deus seria devolvido. Esse era o seu pensamento.
Ao chegar ao local
do sacrifício uma voz o detém e lhe diz compreender a intenção, mas que
esse Deus a quem ele serve não quer sacrifícios humanos, não concede bênçãos
com base em ofertas, não salva com base em obras humanas. Nesse momento Deus oferece um
substituto que é aceito por Abraão. Aqui sim se manifestou a fé de Abraão em
aceitar o substituto. Ele compreendeu que o sacrifício quem faz é Deus, quem
paga a conta é Deus. Compreendeu que Deus dá as bênçãos sem esperar retorno, sem exigir pagamento (Mt
5:45).
Em toda Bíblia, a começar em Gn 3:15,
transparece a história do substituto, da providência divina para a salvação.
Dessa forma penso que a fé de Abraão se manifestou não na oferta do filho a um
deus, mas na aceitação do substituto provido por Deus.
O difícil para Abraão não foi a subida
ao monte, mas a descida. Ao subir ele foi como um homem da sua época, admirado
por todos por estar disposto a cumprir a tradição de oferecer o filho aos
deuses. Ao descer poderia ser visto como um homem frágil que não conseguiu
cumprir com que era esperado dele.
Como explicar aos homens que Deus não aceitara
a sua oferta, se havia “aceitado” a de tantos outros menos dignos do que ele?
Como explicar que não foi covardia, mas uma determinação divina? Como explicar
que o seu Deus não aceitara o seu sacrifício? Havia enganado os homens dizendo
que ira sacrificar o filho?
Penso que a sua fé se evidenciou ao
aceitar o substituo e por isso fico com a interpretação de Paulo.
Antonio Sales profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 29 de setembro de 2012.
Olá Sales, não me atrevo, a tomar uma posição nas falas dos apóstolos Tiago e Paulo, quanto a fé de Abraão, se foi pela obra ou não. Entendo que a idolatria na crença em um Deus verdadeiro, levou Abraão até as últimas consequências de seu ato. A ação de querer sacrificar seu filho, deixa claro a imensa fé para com Deus. Também me pergunto, se realmente Deus precisaria desse tipo de sacrificio para ter certeza absoluta da fé de cada um de seus filhos. Abraão, foi um homem admirável. Dar um filho em sacrifício pelas próprias mãos, requer muita fé e devoção. Achei o texto bom e compreensível, gostaria de posicionar-me melhor, mas não tenho conhecimento suficiente para tal.Abraço guri.
ResponderExcluirO assunto é realmente complexo. É difícil imaginar Deus exigindo um prova dessas de um ser humano. Se parece com um adulto pedindo que uma criança de 5 anos saia sozinha à noite para o meio de um matagal a fim de provar que é homem. Tal adulto seria considerado um abusador ou algo que equivalha. Nós o repudiaríamos.
ResponderExcluirComo aceitar que Deus, considerado por todos como onisciente, respeitoso, todo amor, fizesse isso com um ser humano?
Deus, supostamente, teria outras formas de saber se Abraão era fiel ou não.
Abraços