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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

POR QUE ALGUNS SE AFASTAM DA IGREJA?


Primeiramente, entendo que afastar-se de uma igreja não implica afastar-se de Cristo ou negar o cristianismo. Muitos religiosos, principalmente os que entendem que a sua igreja possui a verdade absoluta, interpretam que afastar daquela igreja é estar perdido. É assim que devemos ver as pessoas: salvas ou perdidas conforme a igreja que frequentam?
O objetivo deste texto não é analisar comportamentos ou dogmas, mas um discurso e a ideia surgiu após assistir um vídeo denominacional. O vídeo foi elaborado com a finalidade de recordar da história da denominação e a cena  inclui um conhecido teólogo, um entrevistador e uma vista a um cemitério. O teólogo, enquanto ambos os personagens visitavam as tumbas de alguns pioneiros, era entrevistado e contava um pouco da vida de cada um deles.
Três dos túmulos visitados eram de pessoas que exerceram forte influência no inicio daquela igreja, mas que depois se afastaram dela. Nesse ponto o entrevistador perguntou ao teólogo sobre as possíveis causas de uma pessoa, que se empenhou tanto, de repente tomar caminho adverso e se afastar dos princípios denominacionais.
A resposta foi surpreendentemente simples e por isso deixou um desejo de saber mais. Deixou a expectativa de que é possível explorar mais a questão levantada.
A resposta apresentada foi: há quatros possíveis causas, a saber:
1.Conhecimento superficial da Bíblia.
2.Conhecimento relativamente profundo, mas não santificado, isto é, um conhecimento intelectual que não atingiu o coração.
3. Descontentamento com o tratamento recebido de algum líder e a pessoa generaliza.
4. Frustrações da vida. A pessoa queria ocupar algum cargo importante e não foi alçada ao cargo almejado então abandonou a instituição.
Analisemos cada uma delas para justificar a nossa afirmação de que  a questão do entrevistador poderia ser melhor explorada.
Resposta1.Conhecimento superficial da Bíblia.
Nesse ponto eu entendo que o pressuposto do teólogo seja que a sua igreja contém a verdade absoluta e quem conhece a Bíblia naturalmente concorda com ela, ou não tem alternativa. Portanto, se afasta quem não conhece o suficiente.
Não poderia ter sido o caso de ocorrer exatamente o oposto?
Resposta 2. Conhecimento relativamente profundo, mas não santificado, isto é, um conhecimento intelectual que não atingiu o coração.
Entendi que isso poderia significar que tais pessoas nunca foram convertidas. É como se as pessoas fossem imutáveis e tendo decidido uma vez nunca mais voltariam atrás. É como se não fosse possível apaixonar outra vez, ter uma nova afeição. É como se dissesse que uma vez salvo então se está salvo para sempre.
Não poderia ter ocorrido de ser exatamente o coração o fator motivador desse afastamento? Quando o coração se frustra está garantido que o cérebro controla?
Resposta 3.Descontentamento com o tratamento recebido de algum líder e a pessoa generaliza.
Essas pessoas eram tão simples ao ponto de não distinguir a parte do todo? Há pessoas que realmente agem assim, mas dificilmente estão em liderança ou encabeçando movimentos.
Resposta 4. Frustrações da vida. A pessoa queria ocupar algum cargo importante e como não foi alçada a esse cargo abandonou a instituição.
Essa pode realmente ser uma causa, mas não explica tudo. Não poderia ter sido o fato de a pessoa não querer ser líder, desejar contribuir e quem está liderando rechaçá-la com medo de perder o espaço? Nesse caso a pessoa se afasta por falta de opção.
Não conheci pessoalmente os personagens citados no vídeo.  Não sei quais as verdadeiras causa do afastamento de cada um. Estou analisando um discurso e não comportamentos. Por ser o discurso de um intelectual penso que posso opinar, pois, todo intelectual sabe que o mundo acadêmico é de confrontos, é um constante passar a limpo. De igual modo não estou questionando os dogmas de qualquer igreja, quero apenas dizer que não se podem simplificar questões tão profundas. O excesso de simplicidade pode não ajudar.
Nova Andradina, domingo, 06 de novembro de 2011.
Antonio Sales  profesales@hotmail.com.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

“PODE CAIR O MUNDO”?


Não gosto muito de escrever sobre música. Não quero dar a impressão de que entrei na onda de supervalorizar o papel dela  na adoração. Vejo-a apenas como um fator  constituinte do culto. Minha preocupação é com a educação, isto é, com os valores que são transmitidos pela igreja, pela música, pelo sermão e por todos os componentes da vida religiosa em geral.
No texto intitulado “O cristão: forasteiro ou residente” questionei a contribuição educativa de um hino clássico e hoje quero questionar a contribuição de uma música contemporânea.
O refrão ou a parte mais repetida da música diz: “Pode cair o mundo estou em paz”. Ela foi composta por dois nomes conhecidos e respeitados pela competência técnica e teológica e também pelo bom gosto na composição de suas músicas.  Por essas razões suas músicas fazem muito sucesso entre os jovens.
Lendo a letra dessa música percebe-se que os autores tinham a intenção de reforçar a necessidade de se confiar em Deus. A minha preocupação está com a escolha da parte onde recai a maior ênfase: “Pode cair o mundo estou em paz”.
Como se sabe essa é a parte de uma música que mais se repete e, normalmente, é a que fica gravada na memória dos ouvintes; daqueles que “cantam no banheiro”. Normalmente esse “cantor” grava somente essa parte que acaba sendo  repetida dezenas de vezes e a frase fica fora do contexto. É com base nesse fator que teço algumas considerações à referida música e me atrevo em dizer que ela é, pedagogicamente, imprópria para ser usada em reuniões de jovens ou no culto.
Uso raciocinar tomando por base fatos concretos. Quando estes não existem crio um, hipoteticamente. Neste caso imaginei um dentista dormindo tranquilamente quando, lá pelas tantas da madrugada, o telefone toca. Ao atendê-lo ouve do outro lado da linha  a minha voz dizendo: “ Doutor, meu filho acordou com uma lancinante dor de dente. Está com aproximadamente uma hora que vimos tentando, com os nossos próprios recursos, diminuir a intensidade da mesma para que se possa esperar o amanhecer do dia. Nossos recursos se esgotaram e ele está ficando desatinado de dor. Se eu levá-lo aí o senhor o socorrerá?”
Imagino agora o dentista respondendo: “deixe-o gritar de dor estou em paz”.  Em outras palavras: como dentista eu e minha família estamos livres desse incômodo e vou dormir em paz.
Temo que seja esta a mensagem que ficará gravada na memória dos ouvintes desses “cantores” de segunda ordem. Temo que esteja sendo transmitido um valor  não cristão: a acomodação diante da desgraça alheia. Que esteja sendo incentivado o cruzar dos barcos e sorrir diante da tão propalada miséria do mundo.
Alguém poderá questionar dizendo que como cristãos devemos mesmo ter paz em meio à “trovoada”. Tenho dúvidas. Será que devo ficar em paz se o meu vizinho está sendo atingido por algum “raio”?
Jesus chorou sobre Jerusalém (Mt 23:37) porque os seus habitantes rejeitaram todas as oportunidades que lhe foram oferecidas. O Mestre não ficou em paz enquanto a cidade corria risco de perdição. Deus, quando viu a humanidade mal orientada pelo judaísmo, mesmo sabendo que a Sua reputação não seria abalada perante o universo, não ficou “em paz”. Não cruzou os braços. O apóstolo Paulo desejou, ansiosamente, levar os judeus aos pés de Cristo. Não conseguiu e foi pregar aos gentios, mas ele não ficou em paz com a rejeição dos seus compatriotas (Rm 9:1-3).
Um cristão, portanto, não pode ficar em paz enquanto o “mundo cai”. Ainda que ele esteja seguro de que a queda do mundo não o afetará (e creio que seja a mensagem que a música quer transmitir). Penso que ele não poderá dormir em paz enquanto os seus irmãos correm perigo. Quando escrevi sobre isso no texto já citado penso que deixei claro que e a minha preocupação é que incentivemos o cultivo de uma atitude de comodismo diante das aflições dos outros.
Preocupa-me pensar na religião com uma fuga dos problemas sociais porque, se isso acontecer, a igreja perderá a sua razão de existir. Não será justo ela arrecadar dinheiro, que poderia ser gasto para investir no preparo de pessoas, e usar em benefício próprio. Não seria correto recrutar jovens e depois não devolvê-los preparados para ajudar os que correm perigo. A religião não pode ser uma fuga.
Sei que alguns pressupõem que a igreja tem somente que pregar o evangelho, mas um evangelho que não me torna humano não é útil. Ser humano, na minha perspectiva, é olhar pela “janela”,  ver o que se passa lá fora, recolher-se  por alguns momentos enquanto se traça um plano de ação e então abrir a porta e partir para a luta em favor do outro. É isso que eu chamo de “serviço” só oferece serviço quem não está “em paz”.
Voltando à música em pauta. Confesso que acho-a bonita e gosto de ouvir a repetição mas, como educador, sinto-me no dever de ir além de um simples expectador. Devo preocupar-me com as questões pedagógicas. Estou preocupado com os valores que ela transmite.
Campo Grande, 20 de outubro de 2011.
Antonio Sales           profesales@hotmail.com

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

DEUS PRECISA DE NÓS?


Quando essa pergunta é feita a resposta imediata que se tem é: não.
Em alguns carros encontramos adesivos dizendo: Deus sem você é tudo e você sem Deus é nada. Esses dizerem, ou melhor, essa crença  nos reduze à insignificância absoluta.
Quem nunca pensou em Deus não tem valor?Minha vida não vale nada? Se eu for ateu então o  meu trabalho e as minhas contribuições sociais não valem nada? O que será que querem dizer com essa frase? É uma ameaça ou uma advertência? É um convite ou  uma intimidação?
Fico com medo quando vejo um adesivo desses em um carro. E se o motorista suspeitar que sou ateu ele me atropelará como se atropela um cachorro louco? E se ele suspeitar que estou me prostituindo,  me executará como se executa um cão com leishmaniose?
Em uma reunião religiosa em que o tema veio à tona e todos diziam que Deus não precisa de nós propus que pensassem em uma família  e  perguntei: em uma família  quem precisa de quem? Os pais precisam dos filhos ou os filhos precisam dos pais?
Resposta imediata: ambos.
A partir daí argumentei que o exposto até ali carecia de sentido e que vinha sendo construído e o tema foi abandonado. O silêncio que se seguiu me deixou perplexo. Entenderam e concordaram? Apenas ignoraram o que eu disse?
Mesmo supondo que tenham concordado ainda penso que a questão não ficou entendida. Penso que na resposta, e quando se calaram, podem ter levado em conta apenas a questões relacionais.  Talvez tenham pensado no fato de que em certa época os pais são o amparo dos  filhos em outra acontece o inverso. Minha questão era outra.
Minha questão é ontológica. Ter a ver com a existência e não simplesmente com a relação. A pergunta era: Deus pode ser Deus sem o ser humano?
Haverá pai sem ter alguém para chamar de filho? Haverá filhos sem ter  pai (um ancestral)?
Haverá broto de uma árvore sem ter resquícios da árvore?
Haverá criatura sem criador? E criador sem criatura? Existiria Deus se nós não existíssemos? Ele seria Deus de quem?
Alguém poderá dizer que o universo tem outros habitantes, logo somos desnecessários. Não entro na questão da existência ou não de outros seres inteligentes, mas não concordo com a conclusão. Minha pergunta é: por que Ele nos criou se não precisava de nós? Estava apenas procurando o que fazer? Fugindo do tédio?
Admitindo que tenha outros planetas habitados, portanto, outras criaturas (essa discussão não está em pauta) Ele seria Deus lá e não aqui. Para ser Deus aqui teríamos que existir.
Pergunta: Existe Deus?
Resposta: sim.
Justificativa: eu existo
Abre parêntese. Suponho que o leitor tenha entendido que não estou dizendo que sou Deus, mas que sou a prova da Sua existência. Algo equivalente a: a minha existência prova que meus pais existiram. Ninguém, em são juízo, me perguntará se meus tataravôs existiram. Fecha parêntese.
O que estou dizendo é que sem nós Deus não existiria como Criador, como Salvador, como Protetor ou outros adjetivos que Lhe atribuímos.
Eu não existo como benfeitor para quem nunca exerci influência benéfica na sua vida. Deus não existe onde Ele nunca atuou. Sendo assim, Deus precisa de nós para existir com tal.
Um homem sem filhos existe como homem, mas não como pai.
Uma mulher solteira existe como mulher, mas não como esposa.
Deus como Deus existe porque nós existimos.
E levando em conta o fator relacional Deus precisa de nós? A resposta está no fato Dele ter nos criado. A menos que admitamos que somos obra do acaso  ou que Ele  nos criou como uma brincadeira, como uma criança brinca fazendo bolinhas de barro e depois atira-as ao léu, somos necessários a Ele.
Meus filhos são-me necessários mesmo quando não estou precisando do apoio deles. Sou pai porque eles são meus filhos e a não existência deles me esvaziaria como pai. A ausência deles seria um indicativo de infertilidade, haveria carência de  sentido na paternidade.
Não sei como se sente uma mulher quando envelhece sem ter filhos, mas sei que esse sentimento tem um nome: “síndrome do útero vazio”. Qual o nome  que daríamos ao sentimento equivalente no homem? “Síndrome da semente que não germinou”?
Quem não faz por acaso, ou para passar tempo, faz porque precisa. Como acredito que não sou obra do acaso creio que eu preciso de Deus e Deus precisa de mim. Talvez necessitemos um do outro em proporções diferentes mas, com certeza,  somo necessários um ao outro.
Campo Grande, 15 de outubro de 2011.
Antonio Sales              profesales@hotmail.com

domingo, 16 de outubro de 2011

A MÚSICA NO CULTO


A música não é o único fator do culto. Muitos outros fatores contribuem para a sua beleza e riqueza ou para sua pobreza e feiura.
No entanto, quase não se vê ninguém debatendo a contribuição do sermão, da oração pública, da simpatia dos irmãos, da cortesia e da atenção para um bom culto. No meio onde vivo o debate gira em torno da música. Aliás,  não é nem um debate porque quase sempre é um discurso unilateral. É um falando e os outros ouvindo calados. Muitos ouvem calados porque não concordam com a forma como o “debate” é conduzido mas sabem que se falarem em nada contribuirão porque o discurso está pronto e o “debate” é só de nome.
O curioso é que querem nos convencer de que a música é o mais importante fator do culto. Qual a razão? A explicação é simples, simplista e absurda. Primeiro dizem que é porque é a arte preferida de Satanás. Depois dizem que ele foi regente do coro celestial e, portanto, um perito em música. O que tem isso a ver  com o que estou dizendo?
Ora, se ele é tão competente quanto se diz então ele deve saber capinar, cuidar de animais, Matemática, Física, Medicina e outras tantas coisas mais. Deve falar a verdade de vez em quando, ser bom esportista e dominar a música clássica também. E daí? Não vou fazer  nada porque, supostamente, é de conhecimento dele?
Essas explicações deixam-me atordoado. Se é a arte preferida de Satanás deveria fazer parte da adoração? O fato de ele ser perito em música tem algo a ver com aquilo que faço ou canto? Estão supondo que ele é a minha inspiração? Se é ele que também inspira a inveja, a intriga, o fuxico e a desordem, então tudo o que se faz em algumas igrejas é inspiração dele?  O que mais se faz em algumas igrejas é cantar e intrigar.
Ninguém se preocupa com a pobreza dos sermões, com a discrepância de uns e o óbvio inútil de outros.
Quando se vai ao médico com uma fratura exposta, gritando de dor, e o profissional diz que está com dor porque está com uma fratura exposta ele falou o óbvio inútil. Primeiro porque o paciente já sabe o diagnóstico e em segundo lugar porque ele espera uma proposta de solução, uma palavra de esperança.
Quando um pregador afirma que a violência que há no mundo e a falta de Cristo no coração das pessoas ele falou o óbvio inútil. Quando ele diz que a sua igreja está apática porque falta o amor, falou o óbvio inútil. Quando afirma que se deve deixar o pecado, fala o óbvio inútil. Quando diz para tirar  a inveja da bagagem fala o óbvio inútil. Quando afirma que o mundo invadiu a igreja falou o óbvio inútil. São coisas que todos sabem, só não estão conseguindo fazer. Todo mundo sabe disso, pois se estamos no mundo, convivemos no mundo, aprendemos no mundo, usufruímos das benesses do mundo, como podemos deixar o mundo na hora de ir para a igreja? Será que eles imaginam que o mundo é como um casaco que pode ser deixado em casa no verão?   
O mundo é como uma roupa de uso contínuo, com a qual se está vestido: se estou nela então ela tem que estar em mim. Não se deixa o mundo assim quando se quer tão pouco se tira a inveja da bagagem com um passe de mágica.
Por que não nos ensinam como administrar o conflito entre os interesses do mundo e os interesses da igreja?
Ninguém reclama disso? Ninguém vai exigir melhora nos sermões?
Lembro-me de uma ilustração que li algures. Dizia que um jovem teologando de uma igreja congregacional se despontava como excelente orador e por isso no dia da formatura foi convidado para pastorear uma igreja grande e abastada. Foi contratado com um invejável salário.
Antes de chegar ele anunciou que iria desbancar diversos deuses cultuados na igreja. Ficaram na expectativa. No primeiro domingo ele pregou sobre o “deus tabaco”. Falou sobre os seus malefícios e sobre a incoerência de um cristão cultivar ou vender o produto e anunciou que no próximo domingo atacaria o “ deus álcool”. À saída ficou na porta para cumprimentar os membros que foram saindo em silêncio. Por último um diácono o procurou e disse-lhe: o pastor sabia que nesta igreja vários dos membros mais ricos cultivam e vendem tabaco?
Ele não se intimidou e no próximo domingo, com o mesmo entusiasmo e agressividade desbancou o “deus bebidas alcoólicas”. À saída o mesmo ritual e a mesma advertência do diácono: muitos dos que pagavam o alto salário do pastor eram donos de destilarias e vendiam no varejo e no atacado a maldita bebida. Mas ele não se intimidou e disse que manteria o título do sermão do próximo domingo: “o deus pesca predatória”.
Na próxima sexta-feira, à tardinha, o diácono o procurou e avisou-lhe que a comissão da igreja, composta em sua maioria por ofendidos em seus dois últimos sermões e que seriam ofendidos pelo próximo sermão, estaria se reunindo naquela noite para decidir se ele seria ainda pastor daquela igreja. Estava em jogo, inclusive, se ele pregaria ou não o sermão de domingo. O jovem se deu conta que precisava fazer alguma coisa para se manter no cargo e perguntou ao diácono onde eles pescavam e foi informado de que era nos rios da região. Teve uma idéia: pediu que se ele não pudesse evitar a sua demissão que, pelo menos, insistisse para que o deixassem pregar naquele domingo.
O diácono teve êxito e naquele domingo ele foi fazer o que seria seu “último” sermão. Pregou com entusiasmo e com palavras agressivas contra a “pesca predatória em alto mar”, em águas intercontinentais. Conseguiu salvar o seu ministério.
É isso que ouço hoje. Ou falam sobre o óbvio inútil ou sobre “pesca predatória em águas intercontinentais”. Nada serve para nada ou muito pouco se aproveita.
As famílias em desespero ficam sem uma palavra de ânimo, os jovens ficam sem orientação, os pais ficam sem saber como educar os filhos na perspectiva daquela comunidade, os pecadores ficam sem saber como superar a crise existencial decorrente, os traídos ficam sem saber como lidar com o perdão, os desanimados saem sem ouvir uma palavra de conforto,  os desprezados saem sem receber um sorriso acolhedor, os desempregado saem sem receber orientação sobre como proceder numa entrevista, os deprimidos saem sem ouvir que a ciência moderna tem alívio para a sua dor,  o invejoso sai sem saber porque é dominado pela inveja, o arrogante sai sem saber o mal que causa e assim por diante.
Não daria para ensinar sobre tolerância e respeito? Não daria para ocupar o tempo ensinando com superar o legalismo e se apropriar da graça?  Não daria para contextualizar o texto bíblico falando sobre a condição social do povo, suas crenças, na época em que foi escrito? Não daria para recontextualizar  o texto dizendo o que serve e que não serve para hoje?
Não seria possível observar as necessidades da membresia e tratar desses assuntos sem afetar as pessoas,  isto é, atacar o problema sem identificar a pessoa?
Não está na hora de mudar? Por que se preocupar tanto com a música se é ela que ainda dá um tom de graça ao culto?  Não será por isso que nas igrejas se canta mais do que se prega?  Cantar instrui pouco, mas alivia o fardo. Os sermões não instruem nada e ainda sobrecarregam a vida com inutilidades  e sentimento de culpa .
Quero concluir dizendo: parabéns aos músicos  que inovam e criam. Pêsames aos pregadores que copiam e aos “debatedores” unilaterais.
Campo Grande, 14 de outubro de 2011
Antonio Sales                              profesales@hotmail.com

domingo, 25 de setembro de 2011

O CRISTÃO: FORASTEIRO OU RESIDENTE?


Na hinódia cristã há alguns hinos clássicos que merecem uma análise especial. Parece que o autor da letra passava por uma experiência ímpar em sua vida e conseguiu verbalizá-la no poema. É possível sentir a angústia que lhe oprimia a alma e o seu desejo de “gritar” por socorro.
A questão que fica é se é uma letra apropriada para ser usada como canto congregacional, indistintamente. Qual a mensagem que ele transmite ao ouvinte? Que lição ensina a quem não está afeito a reflexões sobre a vida cristã, isto é, a quem pauta a sua vida e até mesmo a sua cultura por frases isoladas?
Alguém poderia perguntar: mas, e quem são os que constituem a sua “sabedoria”por frases isoladas?
Qualquer pessoa medianamente culta sabe do que estou falando. Sabe que não são poucos os pregadores que fundamentam as suas doutrinas em textos isolados do contexto e nem se dão ao trabalho de recontextualizá-los. Nem os colocam no contetxo original e nem criam outro contexto para eles. Simplesmente citam-nos e pronto. Há muitos que fundamentam até os seus julgamentos sobre comportamentos pessoais com base em fatos isolados. Inúmeras pessoas, até supostos intelectuais, fazem compilação pura e simples, anexando textos, originalmente isolados, um ao outro sem qualquer conexão que explique porque está sendo feita aquela junção.
Eu já fiz isso por muito tempo e conheço centenas que norteiam a vida por frases isoladas, elaboram sermões com textos descontextualizados, julgam tendo como critério fatos ou frases isoladas. Muitos dos que conheço, e que fazem isso,  julgam-se intelectuais e são considerados como tais pelos seu pares. Não é uma crítica, é uma constatação. Já fiz coro com eles.
Esse é o perigo de se usar qualquer canto congregacional sem uma análise da mensagem que se quer transmitir e sem um esclarecimento ao público ouvinte.
Um hino que conheço e que pertence a essa categoria tem como refrão: “Sou peregrino e forasteiro, uma noite aqui e nada mais”. Esse hino que foi escrito por MBS Dana uma senhora que viveu no século XIX (1810-1883) tem uma melodia muito bonita. É um melodia tradicional italiana que mantém a alma do adorador em suspense. A letra fala de esperança também, porém uma esperança por contraste. Isto é, fala do andar “errante” no “escuro” do munto e da luz que existe no céu.
Que andar errante é esse? Enveredou ela pelo mundo das drogas e da prostituição? Viveu no escuro da ilegalidade e agora se volta para luz do evangelho cheia de esperança? Foi uma esposa maltratada pelo esposo ou uma jovem explorada pelo pai que ansiava por liberdade? Sua luz seria um milagre que a arrebatasse da vida que levava? Era portatora de uma doença e desejava a cura definitiva? Qual era a sua angústia, o escuro da sua vida? Qual era a luz que ela ansiava?
A frase do refrão é preocupante quando pronunciada isoladamente.  O que faz um forasteiro? O que deixa ele como herança? Se esse forasteiro for, além disso,  um peregrino qual a sua lição de vida?
Embora forasteiro e peregrino possam ser tomados como ternos sinônimos estou admitindo uma certa diferença sutil entre eles. O forasteiro, na minha concepção,  é qualquer passante. Um peregrino é alguém que deixou as suas origens e executa um trajeto bem definido, um caminhante com um motivo especial; alguém que caminha para algum lugar.  Segundo a Wikipédia “A peregrinação tem, assim, um sentido e um valor acrescentado que é necessário descobrir a cada pessoa que a executa”.
Mas o que faz um peregrino em benefício do lugar por onde passa? Nada.
Ele não semeia, não cultiva uma planta, não cava uma cisterna, não constrói uma casa, não apóia  uma escola, não abriga uma criança, não dá esperança uma jovem e não zela pelo local. Seu olhar está no “além”. Passará por aqui uma única vez, pedirá ajuda, pernoitará ao relento ou em um abrigo improvisado e seguirá em frente sem deixar herança cultural, emocional ou material. Ele não cria vínculos por onde passa.
Se sou apenas um peregrino aqui nesta terra, se passarei apenas uma “noite”(minha vida é uma noite?) o que me interessa fazer por este lugar? Estabelecerei uma relação ecológica? Estabelecerei uma relação afetiva com o contexto social onde vivo?  Serei sempre um “estranho no ninho”? Terei projetos sociais? Para que tudo isso se passarei apenas um “noite”? Um “noite” cheia de medo, “desabrigado”? Todos deverão ser sempre estranhos para mim?
É essa a vida que quero para mim? Deve ser essa a minha pregação para os fiéis? Será que de fato devo ser um peregrino?
Tenho ouvido de cidades onde por muito tempo havia vandalismo contra pontos de ônibus, telefones públicos, etc. Morei em uma delas e vivenciei isso por algum tempo. Pela experiência que tive e pelo que me contaram sobre outras cidades a minha conjetura (não sou sociólogo) é que essas cidades eram pontos de passagem, isto é, as pessoas saíam de suas terras em busca de algo melhor em outro lugar e essas cidades ficavam no “caminho”. Por acaso, ou por falta de recursos, estabeleciam residência nela, mas pensavam em um dia prosseguir. Seus filhos não era filhos dessa cidade, logo, não tinham compromisso com ela. Em alguns casos essas cidades eram apenas o lugar de buscar recursos para a família que ficara para trás e, por alguma razão (muitas vezes não planejada), estabeleciam  residência ali e constituíam família. Também nesses casos, os seus filhos não eram filhos daquela cidade.O passante não cuida, não tem projetos, não investe no local.
Alguns cristãos tornam-se peregrinos até na igreja. Não investem nela, não apóiam novos projetos e não cultivam amizades.
E eu? Sou peregrino e forasteiro ou sou um residente responsável que constrói uma ponte para o futuro?
Nova Andradina, 24/09/2011.
Antonio Sales  profesales@hotmail.com

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Religião para a Adoração ou para a Vida?

Algumas religiões estão centradas na adoração, a saber, todo discurso, todo preparativo, toda instrução, enfim, tudo está voltado para a adoração. Cuidam de como se portar na “Casa de Deus”, como adorar, qual o traje apropriado e qual a conversa permitida na ”presença de Deus”. Esses são temas frequentemente abordados nos sermões e outras reuniões ou sessões de estudo. Esse é o enfoque dessa religião.
As questões contemporâneas, os relacionamentos familiares tumultuados, a profissionalização do jovem, a superação dos preconceitos, a saúde mental, as questões éticas e a decência (não a moda) dificilmente são temas abordados nos sermões e não entram em pauta nas discussões. Não é uma religião da vida e para a vida, porque não se preocupa com as coisas da vida.  
Meu amigo César Augusto disse que é uma religião que não sai dos joelhos. Ela não sobe para o coração e nem para o cérebro. Não impregna a vida, não estimula a ação, não promove a autoestima e não traz realizações pessoais. Tudo se “resolve” com o joelho.
Com esse perfil essa religião deixa de interferir na vida das pessoas, falha em transformar comportamentos, estreita a mente, produz hipocrisia, leva à indiferença para com as necessidades alheias e desconsideração para com as diferenças individuais.
A linguagem desenvolvida por essa religião é o espiritualês. Tudo na vida tem motivação espiritual (anjos do bem ou anjos do mal conduzem a vida), todos os problemas se “resolvem” pela oração (especialmente se o problema é do outro), Deus sempre “mostra” o caminho (até os caminhos errados que sempre tomamos?) e sempre responde as orações.
O problema, na fala dos adeptos dessa religião, é que por vezes (lê-se: raramente), Ele diz sim, por vezes (lê-se: quase sempre) diz não  e outras vezes manda esperar [por tempo indeterminado].
Há muita diferença entre o não definitivo e o espere se o tempo de espera é indeterminado?
Nessa perspectiva Deus,  na melhor das hipótese, responde um terço das orações. Para um terço delas Ele diz não e a outra terça parte Ele ignora. É uma religião em defesa de Deus porque sempre se encontra uma explicação para o comportamento dEle. É a adoração a um Deus que precisa ser defendido, mas se Ele precisa ser defendido  não há algo errado com Ele (ou com o adorador)? No livro de Juízes há o relato de que Gideão derrubou o altar de Baal e que todo o povo da aldeia se levantou contra ele e queriam a sua cabeça. Então Joás, o pai do ousado jovem, enfrentou a turba com essas sábias palavras: “Porém Joás disse a todos os que se puseram contra ele: Contendereis vós por Baal? livrá-lo-eis vós? qualquer que por ele contender, ainda esta manhã será morto: se é deus, por si mesmo contenda; pois derribaram o seu altar” (6:31).
Se Ele é Deus porque é necessário que O defendamos? Precisamos encontrar desculpas (ou culpados) porque Ele não responde certas orações?
Essas questões não fazem parte do espiritualês. Nessa língua a pergunta mais importante é: o que fizemos de errado na adoração para que Deus não nos ouça?
Mas o espiritualês não termina por aqui. O atrasado que perdeu o ônibus diz que foi Deus que quis evitar algum problema, o pregador que não prepara o sermão ora para que Deus o ilumine na hora de pregar e depois atribui  a Deus  todos os lapsos éticos e conceituais que comete.  Descaradamente afirmam: falei o que Deus quis que eu falasse. Ou então Deus me inspirou a falar isso.
Não seria melhor sair de casa mais cedo para chegar a tempo no ponto de ônibus do que ficar tentando ver a Deus onde Ele não está? Não seria melhor estudar para preparar um sermão que dignifique a Deus, ao pregador e ao público?
A religião judaica era uma religião de adoração. Toda vida do judeu, toda atividade social desse povo, toda religião judaica estava centrada no templo. Se os judeus colhiam pouco é porque não estavam sendo fiéis a Deus ou então era porque estavam trazendo oferta indevida ao templo.
Deus, através do profeta Jeremias condenou esse pensamento. O profeta registrou a seguinte ordem do Senhor:
Põe-te à porta da casa do Senhor, e proclama ali esta palavra, e dize: Ouvi a palavra do Senhor, todos de Judá, os que entrais por estas portas, para adorardes ao Senhor. Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel: Melhorai os vossos caminhos e as vossas obras, e vos farei habitar neste lugar. Não vos fieis em palavras falsas, dizendo: Templo do Senhor, templo do Senhor, templo do Senhor é este. Mas, se deveras melhorardes os vossos caminhos e as vossas obras, se deveras fizerdes juízo entre um homem e entre o seu companheiro, se não oprimirdes o estrangeiro, e o órfão, e a viúva, nem derramardes sangue inocente neste lugar, nem andardes após outros deuses, para vosso próprio mal, Eu vos farei habitar neste lugar, na terra que dei a vossos pais, de século em século”(Jer 7: 1-7).
A mensagem não deixa margem para especulação. Não era a adoração que garantiria a prosperidade do povo, mas a justiça, a ética, o apoio ao fraco, o respeito à vida e não praticar as violências e indecências que as outras religiões autorizavam e aplaudiam.
Ficou claro no texto que o templo, isto é, a adoração não traz garantias e que Deus prefere uma religião para a vida.
Nova Andradina 09/09/2011
Antonio Sales                             profesales@hotmail.com